Guiné-Bissau: Simões Pereira acredita ter a vida em risco no país

Após ser impedido de deixar a Guiné-Bissau, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, considera que o país caminha para uma ditadura, onde “as ordens superiores” substituem as leis.

    
Domingos Simoes Pereira

Em entrevista à DW África esta sexta-feira (23.07), o presidente do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e deputado da Assembleia Nacional Popular, Domingo Simões Pereira, disse que foi impedido de viajar para o exterior sem que as autoridades apresentassem um único motivo formal, alegando apenas “ordens superiores”.

A DW está na posse de um documento, com assunto “embargo de viagem do Deputado Domingos Simões Pereira”, emitido pela Procuradoria-Geral da República, que ordena ao Ministério do Interior que impeça o presidente do maior partido da Guiné-Bissau de sair do país por “existirem fortes indícios de que cometeu os crimes”.

No documento, a PGR cita os artigos 100, 170 e 244 do Código Penal, mas não explicita os crimes aos quais se refere.

Reagindo à situação, Domingos Simões Pereira diz estar a correr risco de vida no país com o abuso de poder vigente, mas avisa que “quem quer deitar fogo à Guiné-Bissau será o responsável por tudo aquilo que acontecer” com a sua integridade física.

DW África: O que aconteceu para ter sido impedido de viajar ao exterior?

Guinea-Bissau I Internationaler Flughafen Osvaldo VieiraAeroporto Internacional Osvaldo Vieira, em Bissau

Domingos Simões Pereira (DSP): Pela manhã, tinha uma audição na Assembleia Nacional Popular com uma comissão especializada e foi nessa altura que um elemento do meu protocolo ligou-me a dizer que estavam a ser colocados impedimentos para a realização do meu ‘check-in’ para a viagem. A notícia a seguir foi de que conseguiu realizar o ‘check-in’, mas que a Polícia – portanto, os Serviços de Imigração e Fronteiras – estavam a colocar impedimentos em relação à minha entrada para o voo.

Desloquei-me ao aeroporto internacional e fui recebido pela comandante que me dá essa informação de que não dispunha de nenhuma ordem escrita, mas que ordens superiores lhe tinham chegado no sentido de impedir a minha viagem.

Fomos exigindo informações mais concretas sobre que entidade, com base em que disposição teria dado tal ordem e, portanto, ficou evidente que não havia qualquer ordem escrita. Não havia nenhuma fundamentação legal. Era algo absolutamente arbitrário e, como disse na altura, cobarde, por parte de gente que só sabe funcionar por detrás das cortinas.

DW África: Não recebeu a tal nota de embargo de viagem que foi emitida pela Procuradoria-Geral da República da Guiné-Bissau?

DSP: Os nossos advogados foram informados de que haveria um documento, um documento forjado hoje [sexta-feira, 23.07], entregue ao Ministério do Interior por parte do Procurador-Geral da República, que não é um magistrado judicial e que mente em todo o documento. Mente no sentido de que eu teria sido constituído suspeito. É mentira porque nunca fui ouvido em qualquer processo. Não existe qualquer processo, como posso ser suspeito? Ainda mente no documento em como estaria na forja a convocação duma reunião extraordinária da Assembleia Nacional Popular, onde este assunto seria tratado.

PAIGC National HeadquartersSede do PAIGC em Bissau

Isso é mentira, não corresponde minimamente à verdade. Mesmo que fosse o caso, estaríamos aqui perante duma situação em que o Procurador-Geral – por ter solicitado o levantamento de imunidade que a Assembleia não aceitou – pode simplesmente invocar que, numa próxima ocasião, a Assembleia poderá vir a aceitar para restringir os direitos e liberdades de um cidadão, neste caso, um deputado da nação.

É o regime que está a tentar-se impor na Guiné-Bissau.

DW África: O próprio líder do partido que governa na Guiné-Bissau diz que não vai aceitar a ditadura. É este o ambiente, é esta sensação de o país a caminhar para a ditadura?

Não é sensação, é a realidade onde as ordens superiores substituem e dispensam a necessidade e existência de documentos e de leis para a sua implementação.

DW África: Domingos Simões Pereira estaria em fuga?

DSP: Só na cabeça de quem decide emitir essa nota. Repare, a primeira tentativa foi feita numa altura em que eu estava no exterior e anunciei o meu regresso ao país. Voltei ao país e aguardámos que se produzissem elementos contundentes em relação àquilo que se estava a evocar. Não houve rigorosamente nada.

DW África: Sente-se ameaçado e sente que a sua vida está em risco em Bissau?

DSP: Penso que é evidente. Quando uma ordem de captura internacional, uma tentativa de levantamento da imunidade parlamentar mesmo perante a inexistência de qualquer processo e agora, a restrição de viagem pronunciada por um Procurador Geral da República, que não é um magistrado judicial – portanto, não está administrativamente a cumprir ordens dum agente judicial que lhe pede o embargo da minha viagem – estamos não só perante o abuso de poder. Estamos perante uma violência que é feita contra um deputado. E é preciso dizer que não sou simplesmente um deputado, sou o presidente do maior partido político da Guiné-Bissau, para além de ser o partido da libertação deste país.

Quem quer criar problemas neste país, quem quer deitar fogo a este país será o responsável por tudo o que acontecer.

DW