Guiné-Bissau assiste a perigosa luta de descredibilização de instituições

Lusa

O analista guineense Rui Jorge Semedo disse hoje que a Guiné-Bissau está a assistir a uma “perigosa luta de descredibilização de duas instituições extremamente importantes”, referindo-se ao atual momento político que o país vive.

“Neste momento, com este braço de ferro entre a CNE [Comissão Nacional de Eleições] e o Supremo Tribunal de Justiça o país está a assistir a uma perigosa luta de descredibilização de duas instituições extremamente importantes”, afirmou à Lusa Rui Jorge Semedo.

O Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau ordenou sexta-feira à Comissão Nacional de Eleições para realizar um novo apuramento nacional da segunda volta das eleições presidenciais, realizadas em 29 de dezembro.

Até ao momento, a CNE ainda não divulgou uma posição, tendo convocado para terça-feira uma conferência de imprensa.

“Neste momento, o país está numa situação muito confusa cujas consequências podem ser imprevisíveis e esta situação piora ainda com as manifestações que estão a surgir, sobretudo, por parte de organismos internacionais”, alertou o analista político.

Rui Jorge Semedo referia-se aos comunicados divulgados recentemente pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e União Africana (UA), que felicitam o candidato Umaro Sissoco Embaló pela vitória nas presidenciais de 29 de dezembro.

“Estes posicionamentos podem contribuir para a fragilização das instituições do país, porque precisavam de aguardar mais um pouco para perceber este braço de ferro e ao mesmo tempo aguardar a decisão do Supremo”, sublinhou o analista político.

Para Rui Jorge Semedo, ao não respeitar a decisão do Supremo Tribunal de Justiça, que “está no topo da decisão jurídica”, e avançar com a legitimação do candidato Umaro Sissoco Embaló, a CEDEAO, que tem mediado a crise política no país, e a UA estão a “empurrar outros atores para fazer valer a decisão da CNE e a deslegitimar a decisão do Supremo”.

“É um risco o posicionamento da comunidade internacional e pode constituir um risco para os esforços que pretendem encontrar uma saída para este imbróglio “, frisou.

O Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau ordenou sexta-feira à CNE para repetir o apuramento nacional nos termos do artigo 95.º da Lei Eleitoral dos resultados das eleições presidenciais, realizadas em 29 de dezembro.

O artigo 95.º da Lei Eleitoral da Guiné-Bissau diz respeito às atas do apuramento nacional e no seu ponto um refere que “das operações do apuramento nacional, é imediatamente lavrada a ata, onde constem os resultados apurados, as reclamações, os protestos e os contraprotestos apresentados e as decisões que sobre elas tenham sido tomadas”.

O mesmo artigo refere no seu ponto dois que “nas 24 horas posteriores à conclusão do apuramento nacional, o presidente da Comissão Nacional de Eleições envia um exemplar da ata aos órgãos de soberania, aos partidos políticos ou coligações de partidos concorrentes” e no seu ponto três que o apuramento tem início “imediatamente após a receção de atas de apuramento regionais, devendo efetuar-se ininterruptamente até à sua conclusão”.

O artigo 95.º refere também, no seu ponto quatro, que “caso faltem atas de apuramento regional ou por qualquer motivo tenha extraviado o envelope que contenha as referidas atas, durante o percurso para a CNE, o presidente da CNE deve, no primeiro caso, tomar providências necessárias para que a falta seja reparada num máximo de 24 horas e, no segundo caso, a conclusão do apuramento nacional deve fazer-se com base nas atas das assembleias de voto que integram a referida região”.

A CNE divulgou em 01 de janeiro os resultados provisórios das eleições presidenciais, sem, segundo o Supremo Tribunal de Justiça, ter terminado o apuramento nacional.

Na sequência de um recurso de contencioso eleitoral, apresentado pelo candidato Domingos Simões Pereira, apoiado pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), o Supremo Tribunal de Justiça já tinha emitido um acórdão a pedir o cumprimento do artigo 95.º da Lei Eleitoral, tendo mais tarde, numa aclaração, insistindo na necessidade de realizar o apuramento nacional.

A CNE, por seu lado, diz que concluiu o processo com a divulgação dos resultados definitivos, que dão a vitória a Umaro Sissoco Embaló, com 53,55% dos votos, enquanto Domingos Simões Pereira teve 46,45%.